
No fim de janeiro, a oficial* do Exército de Salvação em Joinville (SC), Paula Mendes, esteve na Indonésia participando do Encontro de Líderes de Equipes de Emergência da organização.
A atividade foi em Palu, na ilha de Sulawesi, Indonésia. O país é conhecido pela ampla diversidade cultural e religiosa. E apesar de alguns conflitos recentes, a nação tem conseguido reagir bem aos diversos tipos de fundamentalismos que tentam ameaçar o bem comum.
A seguir, confira o relato enviado por ela:
Com cerca de 250 milhões de habitantes, a Indonésia é o quarto país mais populoso do mundo. É também o maior país islâmico do planeta, com cerca de 84% da população identificando-se com muçulmana.
Longe de ser um país tranquilo, o arquipélago com mais de 15 mil ilhas é também um local de constantes terremotos, tsunamis e até um raro fenômeno chamado liquefação, que é quando o solo muda de composição e se transforma em uma espécie de lama que engole casas, coisas e pessoas.
Por ser o epicentro de vários abalos sísmicos, o local escolhido para sediar o Encontro de Líderes de Equipes de Emergência do Exército de Salvação foi a cidade de Palu, na ilha de Sulawesi.

O grupo de 35 participantes se reúne a cada dois anos para compartilhar experiências e receber atualizações sobre os padrões globais de ajuda humanitária.
São pessoas acostumadas a atuar após catástrofes como os terremotos no Japão e no Paquistão, os incêndios na Austrália, os tsunamis no Haiti, os furacões no Bahamas e até mesmo o intenso fluxo migratório de venezuelanos na fronteira do Brasil, que decretou estado de emergência em meados de 2018.
Entre os vários relatos de sobreviventes indonésios, há sempre um misto de alegria e dor. Alegria por terem sobrevivido a um dos piores terremotos da história do país, um abalo sísmico de 7.5 de magnitude que num primeiro instante matou ao menos 2 mil pessoas e deixou outras 5 mil desaparecidas, dor por terem perdido filhos, cônjuges e amigos.
Milhares de corpos sequer foram encontrados.
Quando uma comunidade é destruída por um terremoto, além das casas, outros locais cruciais também são afetados e precisam ser reconstruídos a fim de se resgatar a identidade de um povo. Escolas, hospitais, lojas e centros religiosos fazem parte dos projetos de reconstrução.
E então entra em cena a força de uma comunidade, a resiliência de seus moradores e a ação conjunta de variados grupos, incluindo agências internacionais de ajuda humanitária e o próprio governo.
Em um momento como esse, não há tempo nem motivo para focar em diferenças religiosas, por exemplo. O bem-comum e a esperança falam mais alto.
Os muçulmanos entendem isso quando ajudam os cristãos a reconstruírem suas igrejas. Os cristãos entendem isso quando ajudam os muçulmanos a reerguerem suas mesquitas. Recursos de um governo de maioria islâmica disponibilizados para a construção de templos e igrejas. Recursos de agências humanitárias cristãs disponibilizados para a distribuição de alimentos em comunidades muçulmanas e hindus.
Ao menos na região de Sulawesi, há uma harmonia visível entre os vários grupos religiosos. As cinco chamadas à oração, feitas dos minaretes, são ouvidas por toda parte. Os cristãos, porém, gozam da liberdade de vivenciarem sua fé publicamente e não precisam se submeter às tradições islâmicas, como o uso da hijab. As igrejas são públicas e acessíveis. Assim como os templos hindus e budistas.
O gongo da paz simboliza essa harmonia: um monumento posto no local mais alto da cidade, marcado com os principais símbolos religiosos do país: budismo, islamismo, cristianismo, hinduísmo e jainismo.
Ao redor do monumento, uma cerca com silhuetas de pessoas de mãos dadas em volta de mesquitas, templos e igrejas. Um belo exemplo para aqueles que têm visto o estrago que a intolerância religiosa pode causar em diferentes países.
A dor certamente nos ensina lições importantes. O bom seria não precisar dela para aprender.
A admiração por esse povo fica. O desejo que fica, também, é que a gente não precise passar por catástrofes tão assustadoras para percebermos que, independente de frequentarmos uma igreja, uma mesquita ou um templo, somo todos iguais.
*No Exército de Salvação, pastores e pastoras são denominados como “oficiais”
Fotos: Acervo pessoal